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APÊNDICE 4 – O REINO DE CRISTAL – CAPÍTULO EXTRA 2


O MEIO DRAGÃO.

Nas frias terras do Norte, o gelo disputa espaço com o Deserto da Areia Sufocante, é um lugar onde nenhum ser que tenha pulmões mortais pode atravessar e por isso, há ali uma grande torre oculta que não possui portas em sua base e é tão alta e ingrime que poderia ser divisada em meio as tempestades de pó, mesmo a quilômetros de distância, se houvesse ali algum ser vivo para a contemplar; De fendas ao longo de sua escura extensão, canos de alto calibre apontam em várias direções, uma fabulosa Torre Negra, destinada a abrigar um mero peão nas guerras dos Quatro Reinos, trata-se de uma jovem princesa deposta e arrancada de sua família chamada Sibéria Led, a Branca.
Na torre, os aposentos eram grandes e cheios de classe, um lugar realmente digno de uma princesa, ainda que fosse também uma prisão. Não existiam janelas ou portas a serem fechadas, apenas grandes portais de onde se podia divisar o deserto de um lado, e no outro, a tundra congelada. Devido a altura da Torre Negra a poeira ou o frio não a atingiam, e o tapete vermelho sobre todo o piso permanecia sempre impecável, assim como todos os objetos que reluziam como ouro a sua volta, porém, Sibéria em sua longa tortura sempre irrompia em lágrimas de solidão, pois fora abandonada a tanto tempo, antes mesmo de atingir a idade adulta, que faria qualquer coisa se isto trouxesse mais alguém que não fosse um de seus bichos de pelúcia para conversar; Felizmente, ou não, um dia, isso mudou e ela viu um rapaz de cabelos negros como a noite que havia surgido caminhando pelo portal do deserto, sobre o tapete vermelho e vindo em sua direção; Estava vestido com uma armadura leve e prateada, certamente do exército do Norte. A princesa exitou por um momento levando a mão a seus lábios e receou o que viria daquele soldado vestido da mesma forma que aqueles que a trancaram ali.
-Seus cabelos são lindos.
Disse o rapaz quando se aproximou o suficiente, ela por sua vez corou, passou as mãos nos longos cabelos dourados que pendiam sobre a cama e respondeu:
-O-obrigada…
Ela o olhou fundo nos olhos, o rapaz quase poderia ver seu reflexo no azul dos olhos da garota, então esta perguntou:
-Que queres de mim soldado?
-Vieste para tirar algo que o Norte ainda não tenha me tomado?
_Não sou um soldado do Reino Congelado e não vim tirar-lhe nada, ao contrário, estou aqui para lhe fazer companhia, sou teu noivo e meu nome é Drakon.
O medo cresceu dentro dela, em seguida deu lugar a curiosidade e em sua inocência Sibéria pensou que houvera sido posta ali sozinha apenas para esperar por ele, seu noivo, a quem jamais ouvira falar. Drakon aproximou-se do leito onde a linda garota estava sentada, ela por sua vez, buscou afastar-se, porém, tudo o que o rapaz fez foi colocar algo sobre o lençol, depois virou-se e caminhou em direção a saída, enquanto andava disse:
-Ela é chamada de Sangue dos Dragões, dizem que cresce apenas em terras onde outrora o sangue dos nobres répteis foi derramado.
A princesa apanhou a flor, era pequena e delicada, ainda assim suas pétalas vermelhas ao redor de um ameaçador circulo negro, lembravam olhos de uma fera sedenta por sangue. Sibéria procurou por seu visitante e viu que o mesmo não mais estava em sua presença.
-Não pode ser… esta torre tem quilômetros de altura, e não há entradas, como ele chegou até aqui?
-Não ouvi som algum de veículos o dia todo…
Ela correu para o portal do deserto, por onde o rapaz havia entrado e olhou em direção ao solo; Não tinha nada nem ninguém la embaixo, depois olhou para o céu e viu ao longe, sob a fraca luz da noite, uma figura negra que batia asas.
-Será que!?
Três dias solitários se passaram em que a jovem princesa muito falou sobre seu visitante para seus ursinhos, que eram os únicos amigos que tinha a anos, e a imagem daquele rapaz vestido como um de seus captores deu lugar a ilusão de um galante cavaleiro em sua armadura brilhante; Antes motivo de apreensão e desconfiança agora saudade e desejo; Ela observava a flor murcha em suas mãos perder sua última pétala e suspirava, quando ouviu:
-Lhe trouxe uma nova flor princesa.
Sibéria a recebeu das mãos do rapaz e sorriu, Drakon então se virou e caminhou em direção a porta, seus passos ecoando com som metálico pelo quarto; Mais uma vez a flor atraiu, como que por encanto, o olhar da garota, de modo que ela não pôde ver como o jovem havia deixado seu aposento uma segunda vez.
Mais três dias se seguiram até haver uma terceira visita e outra flor lhe fosse entregue, em seu íntimo Sibéria sempre ansiava revê-lo, ela já o havia aceitado como noivo, porém, este nunca respondia suas perguntas o que a deixou apenas com sua imaginação para atribuir uma origem ao rapaz, e coincidentemente, ela não estava tão longe da verdade.
Na quarta visita, Sibéria fez inesperado para ela mesma, e antes que Drakon saísse pelo portal, correu até ele descalça, o abraçou e disse com voz trêmula:
-Por que nunca fica e nem conversa comigo?
-Se é mesmo meu noivo, deveria conhecer melhor aquela que será tua esposa!
Drakon sorriu estranhamente, se podia ver algo oculto atrás de seu olhar, quem sabe já esperasse que fosse esta a reação da princesa; Os dois voltaram para dentro e se sentaram na cama. Ela o olhava sem sequer piscar mexendo em seus cabelos, depois de alguns instantes desta forma, finalmente perguntou:
-Diga-me, por quê tens me feito tantas visitas apenas para me trazer flores?
_Porque desejo admirar e presentear tua beleza, minha princesa.
Respondeu ele, e vendo a pele pálida de Sibéria assumir um leve tom de vermelho, sorriu ameaçador e acrescentou:
-O Exército do Norte foi quem intermediou nosso casamento com tua família, seu pai concedeu-me a ti, e você a mim.
_Foste obrigado a me tomar por esposa pelo exército?
Drakon não respondeu, havia verdade nas palavras da garota. Antes, ele vivia no Oeste, sobre as areias e cidades de pedra da fronteira, é por isso que tinha um tom de pele tão diferente da jovem princesa; Era um simples ladrão e trapaceiro, com sua face amável e olhar hipnotizante tirava das pessoas o dinheiro para seu sustento, na maioria das vezes de jovens mulheres desavisadas. Até que certo dia, observando a multidão a procura de quem pudesse enganar mais uma vez, ele avistou em meio as pessoas que compravam e vendiam, figuras ocultas sob capuzes e capas; Seu olhar era mais agudo do que do resto das pessoas e por isso divisou debaixo de um dos longos mantos negros, um brilho prateado e familiar.
Fugindo daquelas figuras, correu através da multidão, muitas vezes saltando por entre as barracas e derrubando produtos e alimentos. Por diversas vezes foi quase agarrado por pessoas vestidas de negro que caminhavam com som metálico, Drakon continuou correndo pelas ruas de pedras, e a cada esquina topava com uma pessoa com características similares, fugindo em todas as vezes.
Até que seus pés levaram para um beco com uma parede alta demais para um ser humano comum saltar por cima, olhou para trás e lá estava, outro daqueles homens, Drakon o encarou, porém a sombra nada fez, apenas esperou até que outra se juntasse a ela, e depois outra e mais outra, até que haviam uma dezena de figuras encapuzadas impedindo o caminho do ladrão. De repente, as sombras assumiram uma postura de espanto pois diante de seus olhos o rapaz se preparava para fazer alguma coisa, como se subitamente houvesse se tornado capaz de sair voando pelo céu. Nenhum dos homens porém, viu o que o jovem faria de fato, pois de onde não havia nada antes a não ser uma pilha de lixo e a parede de tijolos gastos, uma espada simplesmente apareceu e pousou-lhe ameaçadoramente sobre o pescoço; Correndo os olhos pela extensão da lâmina até a mão que a segurava, Drakon viu a mulher mais linda que já houvera posto os olhos, tinha pele extremamente clara, cabelos compridos, louros e presos, porém deixando uma franja que cobria até próximo dos olhos azuis; Trajava um vestido branco que se moldava ao corpo e era possível ver que havia um brilho prateado sob ele, com certeza a bela mulher usava uma armadura de Elite sob o vestido, mesmo que sua silhueta indicasse o contrário.
-A Espada que Corta a Serpente.
Exclamou ele. Pessoas nas ruas correram em várias direções abrigando-se e as suas mercadorias da fina chuva que estranhamente caiu sobre o deserto, e Drakon pôde ver que muitos homens mais, com capas e armaduras se aproximavam do beco formando agora uma verdadeira multidão de Elites. Aquela que portava a espada se dirigiu a ele:
-Tu és aquele em que corre nas veias o sangue de Lilith?
-O procuramos por muito tempo, agora acompanhe-nos por vontade própria, ou eu o levarei de acordo com o meu gosto, teu cadáver já será suficiente a nossos cientistas!
Ao ouvir a história de Drakon, Sibéria confirmou suas suspeitas e entendeu quem e “o que” ele era, não se intimidou porém, com isso, fingiu para si não entender o motivo pelo qual o exército mandara os Elite e obrigaram o rapaz a vê-la, ela apenas chorou. Então o rapaz lhe disse:
-É verdade que fui obrigado a encontrá-la, porém, me alegro de que tenha acontecido, todos estes males foram o que me permitiram estar diante da mais linda mulher deste mundo, e desejei por mim mesmo estar contigo.
Sibéria suspirou e respondeu:
-Tem certeza que a beleza de que fala não é apenas um consolo aos olhos que se detiveram sobre Nightwish?
_Não nego que por alguns instantes fui cativado pela imagem da portadora, uma figura repleta de ódio no olhar e fúria nas atitudes.
_Teu olhar é muito diferente do dela, se pode ver fragilidade e bondade, mesmo que agora estejam encobertas pela tristeza; Teus olhos superam em muito o olhar assassino e frio de Nightwish!
Sibéria sorriu timidamente, e pensou por um instante, de forma alguma ela concordava com a criação de tais armas… porém, havia sido manipulada tão brilhantemente, que mesmo tendo ciência do que aconteceria, seu coração ansiava por Drakon, aquele que sempre lhe trazia flores para amenizar a solidão; Ela então inclinou-se em sua direção e o beijou, Drakon acariciou-lhe os cabelos, e após um instante, puxando-a por eles a jogou sobre a cama e beijou seu pescoço com suavidade. Ela sentiu seu corpo ficar cada vez mais quente e com timidez viu seu vestido de renda ser tirado do caminho pelas mãos do rapaz; Sibéria estremeceu e levou ambas as mãos sobre a boca cobrindo-a pela vergonha dos sons que pudessem sair dela; E em dado momento disse com sua voz mais bela e ofegante:
-Drakon, desejo conhecer-te, quero sentir teu verdadeiro eu.
Subitamente, aquele que estava sobre ela e que até poucos instantes era humano, entregou-se as palavras da princesa, e a imagem de um enorme dragão escarlate surgiu escondendo-a embaixo de sua sombra. Ele se deteve por alguns instantes até que a jovem se acostumasse com a situação e a dor se tornasse em êxtase novamente.
A partir daquela noite o dragão deixou de fugir e de roubar dos homens para sobreviver, e não saía de sua companhia por mais que algumas horas para trazer presentes a Sibéria Led; Os dois se entregaram um ao outro, tantas vezes para consolarem-se do que lhes havia sido imposto, que sem perceberem, seu escape se tornou em amor. Quem sabe tenha sido este sentimento tão puro que havia entre os dois, que tornou possível o nascimento de tamanha abominação, pois o fruto desta união foi uma nova e vil raça que assolaria os quatro reinos e derramaria sangue por onde passasse.

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COMO É O INFERNO?

Falar sobre o inferno simplesmente não deixa de ser um assunto interessante (bem… digo isso na falta de palavras mais “adequadas”…) este não é descrito unicamente na Bíblia Cristã, diversas outras religiões e mitologias ao redor do mundo possuem sua própria “versão” do inferno com particularidades e semelhanças que são notáveis. Contudo, este artigo não se destina a compará-lo nos mais diversos cenários, mas sim compartilhar alguns relatos escolhidos a dedo que são (a meu ver) bastante relevantes e/ou interessantes, portanto merecem, ao menos, serem conhecidos. Pintura portuguesa a óleo sobre madeira, datada entre 1510 e 1520, seu verdadeiro autor é desconhecido, mas teria sido encomendada e guardada no Convento de São Bento da Saúde. Eu recomendaria iniciarmos nossa viagem falando sobre o Inferno de Dante, porém, sobre isso acabei discorrendo num outro projeto aqui do Blog (e não pretendo revisar e “relançar” todo o texto), que basicamente é uma revista virtual sobre animes, games e c